A garota da UNIBAN
novembro 10, 2009 at 1:16 am 2 comentários
Destaque da semana nos noticiários, o caso da aluna da UNIBAN hostilizada por usar um vestido curto ganhou novos contornos.
No domingo, jornais de São Paulo estamparam um comunicado da universidade informando a expulsão da estudante. Como fundamentos, o “flagrante desrespeito aos princípios éticos, à dignidade acadêmica e à moralidade”.
No fim da segunda-feira, após críticas de diversas entidades durante todo o dia, o reitor voltou atrás na decisão do conselho e anunciou nova apuração.
Algumas considerações.
Em primeiro, não é difícil imaginar motivos para uma estudante não agir desta forma. O ambiente de uma universidade inspira algum decoro, em vários sentidos, e isto inclui minimamente a apresentação e as vestimentas.
Não se pode também ignorar que uma mulher em roupas sensuais representa, em certos cenários, uma situação de extremo risco a si própria. Infeliz e injusta realidade, da qual qualquer um concluirá, no mínimo, por imprudência.
Por fim, estaria certo quem apontasse no episódio um exemplo negativo de exploração da sexualidade, que desmoraliza a mulher na sociedade e alimenta sexismos.
Talvez seja mesmo mais difícil enumerar os pontos contrários. A intolerância, paralelizando Lennon, é uma arma quente, e somos vulneráveis. Mas que não nos impeça.
Teria sido igual a reação das pessoas caso fosse um homem, sem camisa, em um short curto, ou até mesmo de cuecas, a vagar pelos corredores?
Por outro lado, há crimes para os que se colocam em risco? Faltariam juízes e prisões para o contingente de condenados por fumar, beber, comer alimentos enlatados e/ou transgênicos e/ou fast food, sem falar nos trabalhadores em jornada estendida a respirar poluição, exaustos, nos engarrafamentos da metrópole.
Gente que de uma forma ou de outra, se coloca em risco físico e psicológico, diariamente. Como parte do jogo. Eu e você. Sem que sejamos linchados por isso.
Finalmente, questionável a distinção dos presentes guardiões da decência de uma sociedade que, contraditória, vangloria o status sexual, e permite sem pudor que suas crianças (como as da geração desta estudante) sejam educadas por dançarinas seminuas e suas coreografias insinuantes. Além, é claro, da libido embutida em novelas, publicidades, desfiles de moda e reality shows.
Em outras palavras, toleramos as mais graves e pitorescas deseducações sexuais, mas não admitimos que alguém, por conta própria, aja desta forma. Fora do script.
A modelo acima veste menos do que a garota da UNIBAN, e há muitos outros exemplos, hoje, em qualquer banca ou portal de internet.
Qual a diferença?
Alguns responderão que a universidade é um ambiente distinto das passarelas, o que já denota certa boa vontade, em se tratando de uma instituição mais mercantil do que estudantil, com ares de shopping center.
Quanto aos que atacaram a jovem, não vejo atenuantes. Vejo, sim, o imponderável a enlouquecer multidões enfurecidas. Um potencial destrutivo e imprevisível que não deve ser ignorado jamais.
À protagonista, por sua vez, não cumpre o script da vítima completa e passiva. Fazer parte de uma universidade, assim como um fórum ou repartição pública ou igreja, é um ato de vontade, e implica aceitar certas regras. Para os questionamentos, há vias mais adequadas que a provocação coletiva.
Realmente inaceitável e digna de toda a repulsa e indignação é a reação dos dirigentes, supostos educadores, a redigir os preconceitos e chauvinismos de uma sociedade doente e legitimar a barbárie. Senhores e provavelmente senhoras que, ao contrário da multidão, tiveram semanas para refletir e ponderar.
E ainda assim, amplificaram um erro grave.
Apesar da volta atrás do reitor, defendo a punição exemplar aos dirigentes da UNIBAN. O caso deve ser acompanhado de perto pelas autoridades. Os agressores devem responder por seus crimes.
Penso que a estudante deveria ter sido advertida disciplinarmente, em tempo. À altura de um comportamento inadequado, e nada mais.
Agora, resta garantir assessoria psicológica, não só pelos danos, mas para evitar o circo midiático e novos atos de qualquer maneira autodepreciativos.
Para a sociedade, mais uma oportunidade rica de aprendizado.
Que triste a sina dos poetas, inúteis e estéreis em um mundo onde musas submissas se escondem por baixo de negras e longas vestes de hipocrisia sexual.
Entry filed under: Brasil, Opinião. Tags: Brasil, machismo, sexismo, UNIBAN, vestido curto.
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1.
lua | novembro 10, 2009 às 12:57 pm
Se a universidade não quer que os seus alunos vistam-se da maneira que quiserem, ou ela cria e aplica normas rígidas de vestimentas à todos os alunos (na minha nao pode ir de chinelo, por exemplo) ou então adota o velho uniforme.
2.
Débora Lopes | novembro 10, 2009 às 1:58 pm
Maravilhoso texto. Estou aplaudindo daqui.