Posts tagged ‘Brasil’

Negócios da China

O gigante asiático é o maior parceiro comercial do Brasil e, ao mesmo tempo, ameaça a indústria nacional com sua competitividade ímpar. Como compensar a balança?

Por Rafael Gregorio (Publicado na revista Getulio nº 24)
Ilustração por Weberson Santiago
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Recentemente, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, telefonou ao colega norte-americano Timothy Geithner, secretário do Tesouro dos EUA, para tratar de um assunto em comum: o câmbio chinês. A suposta desvalorização forçada do yuan, a moeda local, vem sendo apontada por partes da comunidade internacional como um dos maiores fatores para a competitividade daquele país, que em pouco tempo saltou do subdesenvolvimento à condição de potência econômica e geopolítica mundial. Mais do que isso, do anterior ostracismo do mundo desenvolvido, a China assumiu o papel de motor do planeta. Nas palavras do presidente Lula, o país foi “o propulsor do espetáculo do crescimento” na última década.

De fato, o desenvolvimento chinês parece ser o segredo da esfinge a ser decifrado ou, na definição da jornalista Sonia Bridi, que viveu na China nos anos de 2005 e 2006 (leia depoimento na página 37), “a maior notícia do momento”. A transição do comunismo para o “socialismo de mercado”, iniciada no final da década de 1970 com reformas que realocaram o foco produtivo da agricultura planificada para a manufatura industrial, passou por movimentos mais recentes de liberalização do comércio internacional e do investimento externo, e impressiona pela organização e rapidez com que o país alcança seus resultados. Especialmente durante a crise econômica iniciada em 2007, a China e sua indústria tornaram-se protagonistas, mantendo em alta os índices de produção e, por consequência, propulsionando a demanda por produtos e serviços de outras nações. Um processo que alavancou economias emergentes, especialmente Brasil e Índia, e despertou interesse e cobiça no mundo desenvolvido.

Assim é que nos últimos três anos assistimos, no Brasil, a uma ainda mais incisiva invasão de produtos chineses. A diversificação agrada à população, agraciada com preços mais baixos para produtos antes inacessíveis, mas acerta em cheio a indústria nacional, incapaz de competir com as condições do parceiro estratégico. De tal forma que, nos meios econômicos, o tema da desindustrialização já desponta como uma das mais importantes discussões no futuro próximo brasileiro.

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maio 30, 2011 at 12:32 am Deixe um comentário

2011, início de uma década inesquecível

A economia nacional celebra seu melhor momento nos últimos anos e projeta estar entre as cinco maiores do planeta em 2020. Quais os desafios e como enfrentá-los?

Por Rafael Gregorio (Publicado na revista Getulio nº 23)
Ilustração por Weberson Santiago

O Brasil vive uma situação inusitada. Acostumado à memória de décadas perdidas e eterna promessa, o país está revertendo o jogo. Este ano deverá ter um crescimento de 7% no Produto Interno Bruto (PIB), o melhor resultado nos últimos 40 anos. A renda per capita aumentou e desta vez o bolo está sendo repartido: mais de 30 milhões de pessoas deixaram a miséria desde 2005, formando a chamada Nova Classe Média, vedete da pujança econômica atual. O desemprego desceu a níveis recordes e, somente neste ano, 3 milhões terão encontrado colocação profissional.

O otimismo é generalizado. Na síntese de Paulo Sérgio Simões Gala, economista e professor da Escola de Economia de São Paulo da FGV, os próximos dez anos se apresentam com “perspectivas fantásticas”. Para ele, esta pode ser a melhor década de nossa história.

Fruto de um longo processo iniciado em 1994 com o Plano Real e seguido adiante pelas administrações de FHC e Lula, a ascensão brasileira no século XXI alimenta apostas em um país diferente em 2020: moderno, competitivo, com capital humano mais bem preparado e inserido entre as grandes potências.

A questão se torna ainda mais instigante à lembrança dos desafios que nos esperam. Questões como o pré-sal, o endividamento externo e os gargalos de infraestrutura devem habitar a agenda nacional e nortear decisões importantes. Por outro lado, a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016 pro- metem momentos de catarse.

Diante de tantas variantes, como o país conseguirá manter o ritmo, realizar seu potencial de desenvolvimento e alcançar as ambiciosas metas de ascender da 8a à 5a economia mundial em dez anos?

Por que o Brasil voltou a crescer

Para os especialistas, prever o futuro exige atenção aos motivos que nos trouxeram de volta ao rumo. E nesse ponto impera um consenso de que o maior deles foi a estabilidade da economia. O economista Marcelo Cortes Neri, também professor da FGV, foi na década de 90 o primeiro a demonstrar a diminuição da pobreza operada pelo Plano Real, quando era pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Como a maioria dos analistas, Neri vê uma continuidade nas políticas econômicas dos últimos 16 anos. Para ele, os acertos têm relação direta com o controle da inflação e dos gastos públicos, a geração de empregos e o investment grade, que sintetizou a credibilidade da comunidade internacional e dos mercados.

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março 22, 2011 at 11:48 am Deixe um comentário

Caminhos perigosos – entrevista René Ariel Dotti

Autor do projeto da Nova Lei de Imprensa, o advogado René Ariel Dotti fala sobre a cobertura da mídia e a tentativa de setores do governo de exercer o “controle social dos meios de comunicação”

Por Rafael Gregorio (Publicado na revista Getulio nº 23)
Fotos Jefferson Dias

O homem que se apresenta na sala de reuniões em um hotel na região da Avenida Paulista onde acontece o 16° Seminário Internacional do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim) o faz com sutileza, a mesma que dará o tom da próxima hora e meia de conversa. A fala mansa e tranquila, carregada no sotaque cantado do Paraná, vocaliza pensamentos concatenados que parecem a todo instante desafiar o improviso – um bate-papo com ares de ensaio. Democrata até no espinhoso terreno do futebol – Coritiba e Palmeiras dividem espaço no coração –, este advogado curitibano com mais de meio século de experiência só levanta a voz uma vez: quando o assunto é a censura à liberdade de imprensa.

René Ariel Dotti construiu sua reputação nos conturbados anos 60 e 70 representando perseguidos políticos da ditadura militar e atuando junto a entidades de resistência ao regime. Nos anos 80, integrou as comissões de reforma do Código Penal e da Lei de Execução Penal. Desde 1981, é professor titular de Direito Penal da Universidade Federal do Paraná. Antes, foi ator – chegou a formar uma companhia com o amigo Ari Fontoura – e durante cinco anos trabalhou na redação do Diário do Paraná. A experiência jornalística inseriu a comunicação social em sua biografia. Décadas mais tarde, lideraria o anteprojeto da Nova Lei de Imprensa. A seguir, os melhores momentos de sua conversa com Getulio sobre o papel da mídia, seus limites e exageros e as recentes investidas da República contra a liberdade de expressão. Para ele, “O controle social dos meios de comunicação é eufemismo para a censura”.

O senhor falou ontem sobre liberdade de imprensa e censura judicial no painel do 16° Seminário Internacional.

René Ariel Dotti Preferi abordar o tema a partir de casos concretos, como as censuras ao jornal O Estado de S. Paulo, proibido de veicular notícias sobre Fernando Sarney há mais de um ano, à Folha de S.Paulo, no caso dos processos movidos pela Igreja Universal do Reino de Deus, em 2008, e a decisão do Tribunal Superior Eleitoral que recentemente proibiu uma reportagem da revista Veja.

John Adams, presidente dos Estados Unidos de 1797 a 1801, previu que, no futuro, a regulamentação da imprensa seria “o problema mais importante, difícil e perigoso que os homens letrados teriam que resolver”. O que o senhor diz?

René Dotti A liberdade de informação se desdobra em três aspectos: a) o direito de informar, característico de quem produz ou retransmite informação; b) o direito de ser informado: receber informação sobre a epidemia de gripe, a situação das estradas, a segurança pública; c) o direito de procurar o local e a fonte da informação. Ligar o rádio, comprar um jornal. No conflito que existe entre a liberdade de informação e os direitos da personalidade, deve prevalecer sempre o interesse público. A vida privada de um administrador público interessa sim, na medida em que evidencie atitudes incompatíveis com a dignidade do cargo, como a embriaguez. É uma presunção limitada a certas figuras como políticos, administradores, artistas, que em alguns casos até renunciam à intimidade em nome de visibilidade. Por mais audacioso ou imoral que seja o texto ou a obra, nunca devem ser censurados. Nós temos exemplos históricos. Nos séculos XVII e XVIII, estátuas sofreram mutilações contra os órgãos genitais, censuras que ficarão registradas para sempre. Outro exemplo de preconceito foi o trabalho da Inquisição contra a tese de Galileu Galilei de que a terra se move em torno do sol. A Igreja considerava isso uma heresia, pois segundo a opinião científica da época a terra era imóvel e estática, suportada por grandes colunas, e o sol é quem dava a volta em torno dela. Galilei foi obrigado a negar sua tese de joelhos para não ser queimado, mas reza a lenda que, ao fazê-lo, disse baixinho: “E pur si muove” (ou seja, mas ela se move). Uma ilustração da resistência do homem contra a intolerância.

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fevereiro 14, 2011 at 9:42 am Deixe um comentário

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